sexta-feira, 15 de junho de 2018

Verbo haver e orações sem sujeito

Por que razão o verbo haver, em grande parte dos casos, não é flexionado?



1. APRESENTAÇÃO DO TEMA
Eu tive uma dúvida há algum tempo atrás, fui estudar sobre o assunto, descobri e estou aqui compartilhando o conhecimento com vocês.


Na maioria das vezes em que eu escrevia o verbo haver no Word, ele ficava sublinhado de verde e a correção sugerida era que ele ficasse sempre na terceira pessoa do singular, de forma impessoal, (há, houve, havia, houvera, haveria, haverá), independente se o sujeito da frase for no singular ou plural. Por que isso acontece?
Se eu falo que existem 5 pessoas na sala, passaram-se 5 minutos desde o momento em que eu comecei a escrever este artigo, ocorreram fatos estranhos neste local, por que razão quando eu substituo o verbo existir, passar e ocorrer por haver ou ter, com o verbo ter ocorre algo semelhante, o verbo não sofre flexão de número, não vai para o plural?
Para obter a resposta, basta perguntar ao verbo e seu complemento:
Existem 5 pessoas na sala – Quem/o que existem na sala? 5 pessoas. Pessoas no plural flexiona o verbo, então, existem, porque “eles existem”.
Passaram-se 5 minutos desde o momento em que eu comecei a escrever este artigo – Quem/o que passaram desde o momento em que eu comecei a escrever este artigo? 5 minutos. 5 minutos passam, porque os minutos passam, o tempo passa. Sujeito no plural flexiona o verbo.
Ocorreram fatos estranhos neste local – Quem/o que ocorreram neste local? Fatos estranhos. Fatos estranhos ocorrem, porque uma característica dos fatos é ocorrer mesmo. Sujeito no plural flexiona o verbo.
2. MACETE PARA NÃO SE PERDER:
Agora substituindo os verbos por haver/ter.
Há 5 pessoas na sala. Por que não “hão 5 pessoas na sala”?
Tem 5 minutos desde o momento em que eu comecei a escrever este artigo. Por que não “Têm 5 minutos”?
Houve fatos estranhos neste local. Houve ou houveram?
Explicando o macete antes de explicar tecnicamente o que está acontecendo, aqui a regra é muito clara para todo mundo quando se conversa no presente do indicativo. Dificilmente alguém vai escrever que os fatos ocorreram “hão” 5 minutos. No entanto, quando nós mudamos o tempo verbal a dúvida começa a aparecer, mas a regra é a mesma da conjugação no presente do indicativo.
Por isso que, se os fatos ocorreram há (e não hão) 5 minutos, quando eu escrever “quando eu estava escrevendo isso, havia (e não haviam) se passado 4 minutos da meia-noite”.
Parece óbvio com essa frase que denota passagem de tempo, mas quando falarmos das pessoas na sala, isso já não é tão óbvio para muitos:
Se eu falar que “há (e não hão) 5 pessoas na sala, então “havia (e não haviam) 5 pessoas na sala”. Mais ainda, se eu falar que “quando eu cheguei, havia (e não haviam) 5 pessoas na sala”, o verbo haver também não flexiona. E tudo isso por causa da mesma regra pela qual não se flexiona o verbo haver na frase “há 5 minutos atrás”, por exemplo.
3. EXPLICANDO O PORQUÊ DO PARANAUÊ
Se você entrou aqui para entender os motivos sem se aprofundar tecnicamente, então o que foi escrito até aqui já satisfez sua dúvida. Obrigado pela visita, siga o Escrevendo Direito e click em recomendar neste artigo. Agora se você quer entender um pouco mais sobre esse fenômeno lingüístico, segura firme, estamos quase na metade.
Essa situação acontece porque quando a sentença gramatical trouxer o verbo haver, com o sentido de ‘existir’ ou ‘ocorrer/acontecer’, o sujeito da oração é inexistente. Da mesma forma que quando eu falo “há 5 minutos”, ou “há muitos anos atrás”, a pergunta que eu vou fazer não é “o que há”, mas “o que há 5 minutos”. O sujeito da frase não existe, por isso que se trata de uma oração com verbo e seu complemento, sem sujeito. Sujeito inexistente.
Posso falar (que) “os fatos ocorreram há 15 anos”, mas a oração “há 15 anos” se trata da oração principal, com o verbo e seu complemento, sujeito inexistente, antecedida pela oração subordinada “(conectivo “que” subentendido) os fatos ocorreram”, essa sim com sujeito (os fatos) e predicado (ocorreram) e verbo (ocorrer). Nesse caso se trata de uma oração subordinada substantiva subjetiva, porque a oração coordenada “os fatos ocorreram” desempenha a função de sujeito da oração principal, tanto que há uma tendência de colocarmos a oração subordinada antes da principal por causa disso.
Se eu escrevo que “Havia duas pessoas no escritório quando eu cheguei lá” o verbo haver não tem sujeito. Há uma oração subordinada temporal indicada pelo conectivo “quando”. O verbo da oração subordinada é o “chegar”, esse sim flexiona. Quando eu cheguei ao trabalho, quando ele chegou, quando nós chegamos, etc. O verbo haver não faz referência ao sujeito, porque a oração principal não tem sujeito. O inverso disso ocorreria se eu escrevesse que quando eu cheguei ao escritório, duas pessoas me esperavam lá, daí teremos uma oração subordinada temporal, sendo que, tanto a principal quanto a subordinada terão sujeitos distintos.
Muita confusão pode acontecer por causa de hipérbatos, ou seja, inversões, colocando a oração subordinada antes da oração principal. No caso acima eu poderia escrever: “quando eu cheguei ao escritório, havia duas pessoas me esperando”. Isso é fácil de perceber porque a oração começa com o conectivo “quando”, que indica se tratar de oração subordinada adverbial temporal. Mais complicado pode ser com as subordinadas substantivas porque o conectivo “que” às vezes é omitido.
Essas frases sem sujeito ocorrem também quando estamos falando de fenômenos meteorológicos. Por exemplo: “chove há 5 dias”. O que está chovendo? Quem está chovendo há 5 dias? O sujeito simplesmente não existe nessa frase, por isso que não há como flexionar o verbo. Flexionar para combinar com o sujeito? Que sujeito?
Quando eu digo que “há 5 minutos que os fatos ocorreram”, o verbo da oração subordinada é “ocorrer”, o sujeito da oração subordinada é “os fatos” e a oração principal é “há 5 minutos”, dessa forma, o verbo haver não está desempenhando a função de predicado de um sujeito, porque essa frase não tem sujeito, não havendo um sujeito que o flexione.
4. MAS, AFINAL, QUANDO QUE EU DEVO CONJUGAR O VERBO HAVER?
O verbo “haver” desempenha essa função de verbo intransitivo, assim como os verbos relacionados a eventos meteorológicos (nevar, chover, estiar, anoitecer, amanhecer...), mas também desempenha uma função de verbo de ligação e quando o verbo “haver” desempenhar essa função de ligação, aí sim haverá a conjugação do verbo combinando com o sujeito da frase:
Muitas pessoas haverão de me esperar amanhã de manhã no escritório.
Tudo ocorreu conforme eles haviam dito.
Nós haveremos de comprar um carro novo ano que vem.
Vós havíeis entoado o hino nacional?
Mas pode ser que eu confunda essas situações com as situações anteriores. Como evitar que eu faça confusão?
Em primeiro lugar, como o verbo haver é um verbo de ligação, neste caso é possível você retirar ele e conjugar o verbo principal:
Muitas pessoas me esperarão amanhã de manhã no escritório.
Tudo ocorreu conforme eles disseram.
Nós compraremos um carro novo ano que vem.
Vós entoastes o hino nacional?
Em segundo lugar, nesse caso, o verbo “haver”, por ser de ligação, sempre precede um verbo principal, o que não ocorre no caso do verbo “haver” ser empregado de forma impessoal.
Em terceiro lugar, nesse caso, o verbo “haver” refere-se a um sujeito, que pode estar expresso ou subentendido (“Nós haveremos de comprar um carro” ou “haveremos de comprar um carro”.

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