Como fazer um modelo de peça processual que possa ser usado, tanto para homens, quanto para mulheres
Há muito tempo atrás, logo que eu iniciei na advocacia, eu conversava com o meu chefe sobre uma situação, pedindo algumas instruções sobre como ele gostaria que eu redigisse a Inicial e ele me falou: “Essas coisas são sempre iguais. Vou mandar um modelo para você. É homem ou mulher?”.
Diante dessa questão eu me perguntei: “por que ter um modelo para homem e outro para mulher? Se é tudo a mesa coisa, por que não eliminar a variável de gênero na redação das peças?”
Evidente que essa minha idéia não se relaciona com a ideologia de gênero, discussões sobre homem nascer homem, mulher nascer mulher e coisas do tipo. Essa questão tem pertinência apenas sobre a redação da peça processual, facilitar a utilização de um mesmo modelo de peça processual, tanto para homem, quanto para mulher, possibilitando até fazer petições em mala-direta sem muitas alterações no corpo da peça processual.
Depois de eu aplicar a minha primeira técnica de redação, eu pude perceber que outros escritórios que tiveram contato com minhas peças passaram a adotá-la também. Acredito que porque foi uma boa idéia e, por isso, eu estou compartilhando com vocês.
Eu decidi, a princípio, passar todos os gêneros da minha peça processual para o feminino, mas sem saber, ao certo como fazer isso. Chegando a um momento da redação em que seria necessário tomar a decisão, eu não sabia ao certo o que escrever, mas meus dedos escreveram: “parte Reclamante”. Algum tempo depois eu até configurei uma rotina de Auto-Correção, para sempre que eu escrevesse “Rte", aparecesse escrito: “parte Reclamante”.
Essa foi minha primeira técnica de redação para o aproveitamento de um mesmo modelo de peça processual, tanto para homens, quanto para mulheres, sem ter que fazer muitas alterações com relação a gênero. Foi exatamente essa primeira técnica de redação que alguns escritórios grandes da região passaram a adotar depois que seus advogados viram escrito nas minhas peças.
Hoje em dia, todas as minhas impugnações, iniciais, recursos, enfim, toda peça processual que eu faço já está com essa metodologia que, nada mais é do que substituir “o Reclamante” e “a Reclamante” por “a parte Reclamante”. Existem outras técnicas de redação que eu estou ainda em fase de implantação. Essas técnicas de redação são: 1) a mudança da voz ativa para a voz passiva e 2) não mais se referir à pessoa do cliente, mas ao fato. Cito exemplos.
Mudança para a voz passiva. Em vez de iniciar a sentença dizendo “A parte Reclamante fazia o trabalho X”, eu passei a iniciar a sentença dizendo que “o trabalho X era feito pela parte Reclamante”. Mudar para a voz passiva em todos os casos? Não! Mudar apenas quando se refere aos litigantes.
Outro exemplo, agora falando do pólo passivo da demanda, em vez de dizer que “A parte Reclamada mudou a parte Reclamante de setor”, eu escrevo que “houve mudança de função”. Isso evita a repetição da palavra “parte”, bem como evita o cansaço na repetição de “Reclamante” e “Reclamada”. Isso não é exatamente uma mudança de voz ativa para a passiva, mas tira o foco das pessoas e passa a focar mais nos fatos. Essa é a segunda técnica de redação que eu passei a adotar e passo a explicá-la:
Quanto à mudança do foco para os acontecimentos, passando da pessoa do litigante para o fato, em vez de dizer “A parte Reclamante ingressou na parte Reclamada em data de 31/03/2017”, eu passei a escrever “o contrato de trabalho teve início em data de 31/03/2017”.
Essas técnicas de redação acabaram fornecendo a uma sensação melhor que a que eu esperava. Passou a ser mais agradável ler e ouvir o texto da peça processual. Em vez de haver uma repetição que mais parecia um mantra, ou uma ladainha, cada tópico, cada parágrafo, cada sentença iniciava-se por um assunto diferente, escrito de forma diferente e isso passou a dar mais fluidez ao texto da peça processual. Não mais tinha aquela repetição no início de cada parágrafo como “A parte Reclamante…”, “A parte Reclamada…”.
Além da questão estética, também houve um ganho significativo de tempo, porque agora existem tópicos inteiros que podem ser usados sem a necessidade de adaptações.
A única limitação que eu encontrei para a aplicação dessa metodologia de escrita foi o preâmbulo da peça processual. Nesse caso eu ainda o escrevo com variação de gênero, uma vez que eu já tentei adotar uma forma mais impessoal, mas ficou um tanto forçado, um tanto artificial, gerando uma sonoridade justamente oposta daquela fluidez conseguida ao mudar o foco da narrativa da pessoa do litigante para a ocorrência do fato.
Outra coisa que eu estou, pouco a pouco, tentando fazer é evitar repetições desnecessárias, assim como evitando fazer petições muito extensas. Como é possível observar pelo exemplo da mudança de setor da parte Reclamante, é possível passar uma mensagem com menos palavras e com a mesma clareza. Aliás, quanto menos palavras nós nos valemos para passar uma mensagem, tanto mais nós evitamos interpretações erradas e perca do foco na leitura. Vale aquele adágio de que “quem fala demais dá bom dia a cavalo”.
Evidente que há casos complexos em que há necessidade de se escrever longamente sobre diversos assuntos, no entanto, também esses casos complexos podem ser fracionados e explicados em frases menores. No ambiente corporativo fala-se muito em dividir a ‘metona’ em ‘metinhas’. Assim, alcançando cada metinha, que é fração da ‘metona’, nós vamos alcançando, também, a ‘metona’, mas uma ‘metinha’ de cada vez.
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